domingo, 15 de junho de 2008

A esterilização em seres humanos

A esterilização em seres humanos pode ser entendida como qualquer intervenção com a qual se torna uma pessoa incapaz de procriar, de modo definitivo e irreversível. Esta pode ser acidental (por exemplo, depois de uma inflamação dos testículos que se apresentam doloridos); cirúrgica (sem castração: com a vasectomia no homem e com a ligação das trompas, na mulher; ou castração, com a retirada do útero). A esterilização se dá mais freqüentemente através de cirurgia (vasectomia e ligação das trompas).
Distingue-se, em razão da reversibilidade, uma esterilização temporária (exemplo, com a pílula anovulatória) e uma esterilização irreversível (com os métodos micro cirúrgicos) ou dificilmente reversível (vasectomia). No momento, deixando de lado a esterilização temporária, tem grande relevância ética a distinção entre esterilização temporária, ou indireta, e esterilização anti-procriativa, ou direta. A esterilização indireta é aquela que resulta de um ato terapêutico colocado para salvar a vida ou a saúde do sujeito, por exemplo, em caso de tumor no ovário ou nos testículos: o agente procura diretamente o fim terapêutico, e a esterilização é efeito indireto do ato médico.
O único motivo que permite, às vezes, uma intervenção lesiva da integridade física, nossa ou de outro, é a caridade e a obtenção de um bem maior para nós e para o outro. A doutrina cristã pode ser resumida nesta afirmação de Pio XI, na Carta Encíclica Casti connubii (31/12/1930), sobre o Matrimônio cristão: “[...] é certíssimo à face da luz natural da razão que os próprios indivíduos não têm outro domínio sobre os membros do seu corpo, senão o que se refere ao respectivo fim natural, não podendo destruí-los ou mutilá-los ou, por qualquer outra forma, torná-los inaptos às funções naturais, a não ser no caso em que não possa prover-se por outra forma ao bem de todo o corpo, visto que os benefícios do matrimônio estão conexos entre si”(n. 24).
Do ponto de vista da avaliação moral sobre uma mutilação será importante distinguir as suas finalidades e as circunstâncias.
São justificáveis quando com base no princípio de totalidade, a “mutilação necessária” é vista como bem da pessoa (por exemplo, para sair de um mal grave e iminente) e aquela terapêutica (de órgão doente ou, muitas vezes, são para salvar todo o organismo). Na ótica da solidariedade, compreende-se a mutilação oblativa (para a doação de órgãos).
Os problemas morais particulares põem duas formas de mutilação: a castração (consiste na oblação dos testículos) e a esterilização (consiste no impedimento da função procriação).
Paulo VI, na Carta Encíclica Humanae vitae (25/07/68), sobre a regulação na natalidade, faz a seguinte assertiva: “A Igreja [...] não considera ilícito o recurso aos meios terapêuticos, verdadeiramente necessários para curar doenças do organismo, ainda que daí venha a resultar um impedimento, mesmo previsto, à procriação, desde que tal impedimento não seja, por motivo nenhum, querido diretamente” (HV 15). “É de excluir [...] a esterilização direta, tanto perpétua como temporária, e tanto do homem como da mulher” (HV 14).
A esterilidade direta ou antiprocriativa é, ao contrário, realizada para que o sujeito não procrie mais: esta intervenção é contrária à dignidade e à integridade da pessoa, que se torna privada ou se priva de uma dimensão essencial do seu ser: a fecundidade física.
Um caso muito discutido é aquele no qual uma nova gravidez comportaria quase certamente em grave risco físico ou psicológico para a mãe: nesse caso, a intervenção esterilizante teria uma finalidade antiprocriativa direta, mas perseguiria junto uma finalidade terapêutica do tipo preventivo.
Podemos sintetizar nas palavras do Dr. Elio Sgreccia, a doutrina da Igreja Católica que tolera a esterilização somente quando a intervenção ocorrer nas seguintes condições:
a) deve ter o consentimento do paciente;b) deve estar ordenado ao bem próprio do organismo sobre o qual se intervém; pelo menos deve considerar e compreender também o bem da totalidade do organismo sobre o qual se intervém;c) deve ser uma intervenção necessária, ou seja, que não apresente alternativas válidas;d) a necessidade deve ser atual no momento da intervenção;e) a intervenção direta deve ser feita na parte doente para retirá-la; se daí resulta uma esterilização, esta deve ser indireta. Pode-se extrair a parte sadia somente quando é a causa real de uma patologia não eliminável de outro modo. É o caso da retirada do útero de uma mulher que, por via de conseqüência, torna-se estéril a partir daquele momento (SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética – Fundamentos e Ética Biomédica. Tradução de Orlando Soares Moreira. São Paulo: Loyola, 1996, 481-482).
A Igreja, para sustentar sua posição, se apóia em dois princípios: o da indisponibilidade da pessoa humana e da unidade e totalidade da pessoa.
Pe. Luiz Antonio BentoAssessor da Comissão Episcopal para a Vida e Família

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