sexta-feira, 20 de junho de 2008

Consciência e moralidade: moral hoje

Diz-se clàssicamente que o fim não justifica os meios.
Será isto verdade mesmo em nossos dias, quando os ho­mens enfrentam situações inéditas?»
Resumo da resposta: A moralidade do ato humano é aferida não somente pela finalidade desse ato (intenção do agente), mas também pelo objeto ou a matéria em torno da qual esse ato versa. Há atos cuja matéria é em si má; tais são os que contradizem às leis da natureza (não matar, não roubar, respeitar a dignidade do pró­ximo...).
Para chegar a determinado fim, o homem tem de recorrer a meios adequados; quem quer o fim, quer os meios. Donde se segue que o fim e os meios são envolvidos no dinamismo de um só querer. Por conseguinte, se alguém escolhe um meio moralmente mau para atin­gir um fim bom, cai em contradição consigo mesmo; quer o bem e o mal ao mesmo tempo; assim destrói o valor bom de sua ação. Não beneficia nem a si nem ao próximo.
Daí dizer-se que o fim bom não justifica os meios maus, nem na era da técnica, quando tantas são as seduções para justificar quais­quer meios. Sempre que alguém
Resposta: Todos os homens de bom senso foram, até os últimos tempos, unânimes em afirmar que o fim não justifica os meios ou que, em consciência, não se pode empregar qualquer recurso para atingir uma finalidade boa, por mais pura ou útil que seja. Este princípio parece tão evidente que poucos autores sentem a necessidade de o provar. Todavia há quem julgue que, diante dos problemas totalmente novos dos nossos dias, o axioma possa e deva sofrer exceções, ... exceções de emergência justificadas por necessidades extremas. - Em conseqüência, vamos abaixo analisar sucintamente a proble­mática; após o que, tentaremos responder à dúvida suscitada
1. A problemática
O mundo de hoje, com sua explosão demográfica e os problemas que ela abre, ... com os novos recursos da ciência e da técnica, tem inspirado aos homens certos comportamen­tos em que o fim reto e honesto parece justificar meios que os antigos reprovariam:
inseminação artificial para dar a cônjuges estéreis a alegria e a estabilidade de um casal fecundo;
o uso de recursos anticoncepcionais para não sobrecarregar uma genitora ou um casal já muito onerados;
a esterilização de indivíduos tarados ou enfermos, a fim de que não propaguem males sociais;
o uso da tortura para se extorquirem segredos e assim pôr a salvo a vida de milhões de homens ameaçados por terroristas;
o suicídio empreendido por um prisioneiro a fim de, no auge da dor, não vir a denunciar seus companheiros de luta ou cair na desonra;
o aborto para evitar prole defeituosa ou indesejada;
o sacrifício de vidas humanas inocentes a fim de se obterem me­lhores condições para as gerações futuras.
Em tais casos, os fins ou objetivos são sempre legítimos; os meios eram reputados iníquos. Hoje em dia, porém, per­gunta-se se tais meios não são legitimados pela perspectiva de uma finalidade boa. Os motivos para que se proponha a ques­tão podem-se reunir em três incisos:
1) a multiplicação de meios e recursos que aliviam e facilitam a luta do homem, multiplica as tentações de se usa­rem meios que, segundo os conceitos clássicos, seriam ilegíti­mos, em vista de metas legítimas. Assim, por exemplo, a fecundação artificial, outrora empreendida no gado apenas, hoje em dia pode ser com êxito efetuada também no ser humano, com «vantagens» altamente decantadas;
2) a civilização contemporânea gera uma mentalidade que é cada vez menos propensa a aceitar a Moral e as exigências da consciência. Mediante a técnica o homem moderno se acostumou a ver paulatinamente cair os obstáculos às suas conquistas; barreiras outrora insuperáveis vêm cedendo... Daí sentir ele a dificuldade de tolerar que a Moral refreie ou detenha a execução de planos ousados ou grandiosos. O «prin­cípio da eficácia» leva a não rejeitar meios censuráveis dos quais se possam esperar resultados sedutores;
3) hoje em dia acentua-se muito a «Moral da intenção». Segundo esta, tal ou tal não é bom ou mau em si mesmo; é a intenção de quem o pratica que o torna lícito ou não; a Moral deixa de ser objetiva para se tornar meramente sub­jetiva; «não se considere aquilo que alguém faz, mas a in­tenção com que o faz». Em conseqüência, matar um inocente por espírito de rancor ou vingança seria condenável; todavia matá-lo para salvar uma cidade seria louvável.
Para a Moral da intenção, os meios não precisam de jus­tificativa moral; têm função meramente técnica; são «amorais» ou moralmente neutros. Daí a ruptura, freqüente em nossos dias, entre a Moral e a técnica. A Moral (intenção, consciên­cia subjetiva) seria algo de estritamente pessoal, variável de indivíduo a indivíduo, ao passo que a técnica (a eficácia, o rendimento científico, o progresso) seria algo de objetivo ou um problema da sociedade como tal. A Moral nada teria a dizer no setor da técnica.
Eis como se coloca o problema de nossos dias: pode-se ainda sustentar que o fim não justifica os meios? ... ou que a consciência moral tem direito a emitir julgamento sobre os comportamentos que a civilização sugere (às vezes, imperiosa­mente) ao cidadão moderno?
Procuremos a resposta para a questão.
2. Bem e mal: o subjetivo e o objetivo
1. Antes do mais, note-se que dois são os elementos que tornam um ato moralmente bom ou mau, legítimo ou ilegítimo:
- o objeto desse ato ou a matéria em torno da qual versa o ato: assim ensinar ciências e civismo
a um ignorante é ato, por seu objeto, bom. O ato de dar esmola a um indi­gente é, por seu objeto, bom;
- a finalidade ou a meta que se tem em vista ou que se intenciona quando se pratica o dito ato. Esta também tem que ser boa ou reta para que o ator seja moralmente bom. Por conseguinte, quem ensina a um ignorante no intuito de se furtar a imperiosas obrigações de seu ofício ou emprego, está procedendo, mal (pois a finalidade é má). Quem dá ali­mento a um faminto, pretendendo furtar-se a lhe pagar o justo salário, procede mal.
Vê-se, pois, que, para que um ato seja moralmente bom, é preciso seja bom não somente pelo fim ou objetivo ao qual se dirige, mas também pela matéria em torno da qual versa.
2. Desenvolvendo tais idéias, pode-se dizer:
O que torna um ato moralmente bom ou mau, legítimo ou ilegítimo, não é somente a intenção de quem o pratica... Também não é simplesmente o julgamento ou a avaliação de quem age. Além destes elementos subjetivos, existe um crité­rio objetivo para se definir o agir humano. Tal critério é a matéria ou o objeto desse agir.
Ora são atos moralmente bons por sua matéria ou por seu objeto, os atos que atendem às exigências da natureza humana. Com efeito, a natureza humana impõe ao homem certas normas para que o indivíduo se realize ou se torne mais homem; burladas essas normas, o indivíduo se desfigura. Tais normas são válidas em todos os tempos (elas são ante­riores a qualquer tipo de educação ou filosofia) entre essas exigências, está a de respeitar os direitos do próximo, a de amar os semelhantes, a de não fazer a outrem o que ninguém quer seja feito a si mesmo, a de não matar um inocente.. . Todo ato que se conforme a tais imperativos, é moralmente bom; leva o homem a ser mais digno.
Ao contrário, moralmente mau por seu objeto é o ato que desrespeite as leis da natureza, ato que, em vez de levar o homem a adquirir a perfeição para a qual ele é natural­mente chamado, o desfigura e depaupera.
A título de complemento, não se poderia deixar de dizer aqui que o ser humano não «se realiza» de maneira leiga ou sem Deus. Se­guindo as normas de sua natureza, o sujeito segue as leis de Deus, Autor da natureza. Realizando-se a si mesmo, o indivíduo se torna mais próximo de Deus, mais brilhante reflexo da perfeição do Cria­dor. - Nestas páginas estamos propondo a doutrina de tal modo que possa ser aceita também por quem não queira encarar diretamente o problema de Deus.
3. Fim e meios
Acontece freqüentemente que coloquemos certos atos não porque os intencionamos como tais, mas porque os subordina­mos, como meios oportunos, a determinada finalidade - fina­lidade reconhecidamente boa.
É então que se põe a pergunta: não será lícito recorrer a qualquer meio, contanto que se tenha em vista um objetivo reto e digno?
A resposta há de ser negativa.
Por quê?
- Porque fim e meios constituem como que um só objeto do querer ou da vontade de quem age. Sim; fim e meios estão intimamente relacionados entre si, de tal modo que quem quer tal fim, deve querer tal ou tal meio[1]. É, portanto, com um único ato de minha vontade que eu quero o fim e quero os meios correspondentes. Em outros termos: o fim e os meios estão envolvidos no dinamismo de um só querer.
Ora, como já foi insinuado atrás, nem todos os meios têm em si o mesmo valor moral. Assim como há meios que con­tribuem para dignificar o homem, há outros que concorrem para o destruir ou degradar; tais são os roubos injustos, o homicídio do inocente, a tortura que desrespeita as personali­dades. Por conseguinte, se tenho uma intenção boa (a inten­ção de obter algo de bom), só posso aplicar-me a querer meios bons. Sei que o valor de tais meios não é aferido por critérios de técnica ou de rendimento econômico ou de produtividade e eficiência profissional, mas, sim, pela aptidão de tais meios a promover a grandeza e a dignidade do homem, tornando-o mais homem, mais voltado para o seu Fim Supremo (o Fim que responde às aspirações mais características do ser hu­mano), e não apenas mais eficiente no setor da indústria, do comércio, da arte ou da ciência.. .
Em conseqüência, note-se: o homem que empregue um meio mau ou indigno para atingir uma finalidade boa ou digna, cai em contradição consigo mesmo, comete uma inco­erência ou uma desdita. Eis, em última análise, por que não se justifica que alguém utilize meios em si maus para obter objetivos bons: tal sujeito diz ao mesmo tempo SIM e NÃO a si mesmo ou à dignidade humana e aos valores que ele pre­tende alcançar. Empregando um meio mau, a pessoa se di­minui ou renega quando precisamente intenciona dignificar a si mesma e ao próximo. - Na verdade, a sociedade não é beneficiada quando um de seus membros se avilta, ainda que este intencione auxiliar a sociedade.
Para ilustrar tais afirmações, pode-se recorrer ao exem­plo da tortura. O dever de salvar os compatriotas pode (e deve) aparecer a alguém como uma tarefa sagrada; tal pessoa não se poderia furtar a esse dever sem se sentir infiel a si mesma, ao próximo e a Deus. Todavia, se, para obter a sal­vação dos seus semelhantes, o sujeito lança mão da tortura (a qual, em si, é indigna ou imoral), ele se opõe a si mesmo (à sua dignidade), ao próximo (à dignidade do semelhante) e a Deus mesmo. Em conseqüência, ele não beneficia nem a si nem a outrem. Para atingir sua finalidade, tal pessoa em­prega um meio que, na verdade, a afasta da dita finalidade.
Parece oportuno sublinhar que o valor moral dos meios (como também o dos fins) é um dado que o homem não cria nem estipula, mas que ele recebe da ordem natural das coisas. Ninguém se realiza de qualquer modo ou empregando quais­quer meios; paralelamente, uma semente não dá qualquer planta, mas está subordinada às leis da sua espécie.
A propósito pode-se recomendar o artigo de V. de Couesnongle: «La fin et les moyens», em «Supplément de la Vie Spirituelle» nº 65, mai 1963, pp. 293-312.
Estêvão Betteneourt O.S.B.
____
NOTA:
[1] Um dos correspondentes de Karl Marx, o pensador alemão Ferdinand Lasalle, escreveu a Marx:
«Não mostres apenas a meta; mostra também o caminho. Pois a meta e o caminho estão de tal modo associados entre si que um muda quando o outro muda... Um caminho novo indica uma finalidade nova»
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Sexta-feira, 15 de Junho de 2007

Consciência e moralidade: tortura é valida?
(Revista Pergunte e Responderemos, PR 122/1970)
"Pode a tortura ser admitida como processo válido para pôr fim ao terrorismo e defender a pátria»"?
Resumo da resposta: A tortura era reconhecida e aplicada pelo antigo Direito Romano. Todavia caiu em total desuso quase no fim da Idade Antiga por influência de pensadores cristãos (inclusive o Papa Nicolau I, 858-867). O renascimento do Direito Romano, no século XII, fez que a tortura voltasse a ser aplicada oficialmente nos séculos subseqüentes. A partir do século XVI, levantaram-se vozes contrárias a tal praxe, de sorte que nos séculos XVIII/XIX ela desa­pareceu dos códigos penais. Continua, porém, a ser aplicada por certos regimes, recorrendo a processos modernos despersonalizantes, que atentam profundamente contra a dignidade humana.
A Igreja reprova a tortura como sendo atentado violento à pessoa humana, a qual tem direito a ser respeitada em seu físico e em seu psíquico. Nem mesmo em vista de coibição de crimes é lícito recorrer a tal procedimento, pois em hipótese alguma o fim justifica os meios.
---X---
Resposta: Torturar, no sentido judiciário e preciso, é sub­meter alguém a, tormentos progressivos (que se podem tornar desesperadores), a fim de extorquir-lhe uma confissão de culpa, uma denúncia ou outra declaração, tidas como úteis ao bem comum ou à extirpação de males públicos (como sejam o ban­ditismo, a guerrilha, o terrorismo. ..).
A tortura, nos últimos tempos, tem sido oficialmente con­denada no Brasil como sendo contrária aos direitos do homem. A fim de ilustrar o assunto, vamos, nas páginas que se seguem, examinar com atenção os argumentos evocados no decorrer dos séculos para defender e impugnar a tortura; finalmente proporemos o ponto de vista da consciência cristã sobre a questão.
1. Tortura: histórico
1. Constranger alguma pessoa pela violência a reconhecer ou indicar algo é modo de proceder a que os homens devem ter recorrido desde remotas épocas.
Os povos antigos procuravam apurar a verdade em maté­ria criminosa ou pelo emprego de tortura ou pelo recurso aos «juízos de Deus» ou ordálios. Os ordálios eram artifícios ou provas a que os juizes submetiam as pessoas suspeitas (faziam­-nas atravessar o fogo, atiravam-nas na água profunda, subme­tiam-nas a um duelo.. .); caso os acusados superassem ilesos tais provas, eram tidos como não culpados (o próprio Deus estaria dando testemunho da inocência dos acusados).
A tortura estava em uso nas cidades gregas pré-cristãs (séculos VII-IV a. C.) assim como no Império Romano. Era largamente aplicada a escravos, para que confirmassem as suas declarações (pois os patrões não confiavam nem na simples palavra nem no juramento dos escravos). O Direito Romano a princípio isentava da tortura os homens livres, mas já no fim da República Romana admitia-a para quase todos os cidadãos. Os cristãos do Império sofreram a tortura para desdizer à sua fé em Cristo e sacrificar aos deuses.
A tortura entrou em declínio quando os povos bárbaros invadiram a Europa. É bem possível que os germanos não conhecessem a tortura, mas apenas os ordálios ou juízos de Deus, cuja prática eles espalharam largamente pelos territó­rios europeus.
2. No século XVI o reflorescimento dos estudos do antigo Direito Romano ocasionou a restauração da tortura nos proces­sos judiciários civis da Idade Média: adotaram-na os reis
Fre­derico II da Sicília (1215-1250), Luís IX da França (1226­-1270), Afonso X de Castela, assim como as constituições de cidades da Itália, da Alemanha, da Flândria.
Quanto aos juristas ou canonistas da Igreja, seguiam a norma formulada em 1140 pelo famoso mestre Graciano «Quod confessio cruciatibus extorquenda non sit. - A confis­são não há de ser extorquida mediante tormentos» («Decretum Gratiani» e. 15, qu. 6, § Quod vero).
Todavia a partir do século XIII, estando a tortura em uso nos processos civis, os canonistas tiveram que reconhecê-la nos tribunais da Inqui­sição.
Diga-se de passagem: a Inquisição nunca foi um tribunal meramente eclesiástico, mas desde o seu início funcionou sob a ação conjunta de eclesiásticos e civis; estes foram mais e mais prevalecendo na Inquisição, a ponto que esta veio a ser, a partir do século XIV, um instrumento cada vez mais habilmente manejado pelos reis e senhores civis da Europa; estes tencionavam assim executar planos de interesse pessoal ou nacional. Cf. o artigo sobre Inquisição em «P. R.» 8/1957, pp. 23-33.
Os juristas medievais estipularam certas restrições à apli­cação da tortura:
1) houvesse plena certeza de que o delito fora cometido;
2) houvesse relativa certeza em torno da pessoa culpada (relativa certeza decorrente de uma prova poderosa, mas ainda insuficiente);
3) não existisse outro meio para se adquirir plena cla­reza no caso.
Mas nem mesmo todas as pessoas que se enquadrassem nestas condições estavam sujeitas a torturas. Ficavam isentos os anciãos (após os 60 ou 70 anos), as crianças (antes dos 14 anos), as mulheres grávidas, os enfermos, os feridos e (na medida em que estivessem impossibilitados de seguir um inter­rogatório) os amentes e os surdos-mudos. - Ao juiz não era lícito mandar proceder à tortura caso não admoestasse previamente a pessoa acusada, dando-lhe tempo e meios de se defen­der. Em muitos casos não bastava a sentença de um juiz, mas exigia-se que ao menos dois juizes decretassem a aplicação da tortura. Ao juiz tocava orientar a tortura e responsabilizar-se por suas conseqüências; um médico devia acompanhar o indi­víduo torturado a fim de lhe prestar a devida assistência em casos infelizes. Os oficiais de justiça que aplicassem abusiva e exageradamente a tortura, eram sujeitos a penas, inclusive a pena de morte (caso provocassem a morte do torturado); tam­bém eram punidos os oficiais que negligenciassem dar aos acusados as garantias que as leis lhes asseguravam.
Caso o réu confessasse a sua culpa ou fizesse alguma declaração sob o efeito da tortura, era convidado a confirmar os seus dizeres diante de um tribunal, livre e distante de todo tormento, a certo intervalo de tempo (geralmente 24 horas depois). Essa confirmação posterior - e essa só - decidia a sorte do réu, pois a confissão de culpa extorquida, mas não confirmada, era tida como nula (servia apenas de indício para que se repetisse a tortura). A tortura podia ser repetida duas vezes; se nos três casos o acusado confessasse e depois recusasse confirmar, e se não houvesse indícios claros de que era, de fato, réu, o tribunal o punha em liberdade (por insuficiência de provas); apenas se lhe aplicavam doravante certas medidas de cautela, pois era pessoa suspeita.
O acusado que confessasse até o fim a sua inocência, resistindo a todos os tormentos, era considerado isento de culpa e suspeita.
3. No século XVI começaram a se ouvir vozes autori­zadas contrárias à tortura em vez de a julgarem um mal necessário, que seria preciso aceitar, apresentavam-na como expressão de barbárie, que seria mister remover. Apareceram, no século XVII, obras que propugnavam a abolição da tortura, tanto da parte de escritores católicos (Fr. von Spee, J. Schaller, A. Nicolas), como da parte de protestantes (J. Graefe, M. Bernhard); o número desses escritos foi crescendo no século XVIII, de modo a impregnar a opinião pública. Em conse­qüência, a tortura foi oficialmente eliminada dos processos judiciários da Europa ocidental entre fins do século XVIII e início do século XIX.
Todavia esse duro tratamento continua, sob títulos diver­sos, a ser praticado até nossos dias: os regimes totalitários tendem, sim, a extorquir confissões e declarações das pessoas suspeitas mediante os mais requintados recursos, que vão desde a violência física até a coação moral, a despersonalização do sujeito, a lavagem de crânio, os interrogatórios «de terceiro grau». .. As finalidades visadas pelos modernos torturadores são paralelas às dos antigos; apenas os meios de tortura são mais esmerados; além do que, hoje em dia não se reconhecem aos indivíduos torturados as garantias e os direitos que os medievais, em sua boa fé, estipulavam em favor dos acusados. Assim a tortura contemporânea pode assumir formas mais atrozes e atentatórias do que a antiga.
Passemos agora à consideração do aspecto moral da questão.
2. E a consciência ... ?
1. Na antigüidade pré-cristã, os gregos e romanos pare­cem não se ter preocupado muito com o aspecto moral da apli­cação da tortura; não abordaram o assunto senão dentro dos termos da jurisprudência.
2. Antigüidade cristã. São os pensadores cristãos os que, pela primeira vez na história, propõem uma avaliação mural de tal praxe: avaliação negativa. Assim Tertuliano († após 220) declarava indigna de um juiz cristão a aplicação de tor­mentos («De corona» 11; «De idololatria» 17); S. Agostinho († 430) denunciou a injustiça que vem a ser a aplicação de uma pena certa por um delito incerto («De civitate Dei» 19,6); o Papa Nicolau I (858-867), consultado a respeito pelos búlga­ros, reprovou a tortura, que, dizia ele, «não era admitida nem pelas leis divinas nem pelas leis humanas, pois a confissão deve ser espontânea, e não arrancada pela violência»[1]. Retomando essa fórmula, o famoso «Decreto de Graciano», fonte autori­zada da jurisprudência eclesiástica, mandava: «A confissão não deve ser extorquida, mas, antes, ser professada esponta­neamente. - Confessio non extorqueri debet, sed potius sponte profiteri».
O pensamento cristão se manifestou sempre do mesmo modo até a Alta Idade Média.
3. Idade Média. Quando no século XII a tortura, que oficialmente deixara de vigorar, foi reintroduzida pelas auto­ridades governamentais, ela foi enquadrada pelos juristas civis dentro de um sistema do qual ela dificilmente poderia ser can­celada. Os mestres cristãos então apenas puderam obter mode­ração no uso desse recurso. A literatura cristã dos séculos XIII e XIV apresenta não poucos conselhos e exortações à brandura dirigidos aos inquisidores que, conforme a praxe da época, aplicavam a tortura. A propósito ocorre interessante página de Jean Guiraud:
«É preciso dizer que a Inquisição aplicou a tortura não com a crueldade requintada que lhe atribuem os seus adversários, mas com as maiores cautelas e em casos totalmente excepcionais... Todos os manuais dos inquisidores faziam observar que a tortura só devia ser infligida em casos muito graves e quando houvesse séria probabili­dade de culpa... Para submeter alguém à tortura, era necessário que se tivesse 'meia-prova' do seu crime, por exemplo, dois indícios sérios, dois indícios veementes, como dizia a linguagem dos inquisi­dores (o depoimento de uma testemunha digna de crédito e a má fama, os maus costumes ou as tentativas de fuga do acusado). A tor­tura só era aplicada quando estavam esgotados todos os outros meios de investigação. Não ficava ao arbítrio exclusivo do inquisidor pres­crever a tortura... O Concílio de Viena em 1311 decretou que cada caso fosse submetido a uma comissão, a qual deveria sujeitar sua sentença ao bispo diocesano.
Em tais condições, a Inquisição só raramente recorreu à tortura. No sul da França, onde a Inquisição esteve tão ativa nos séculos XIII e no início do século XIV, os inquisidores usaram tão pouco a tortura que certos historiadores se surpreenderam com isto e qui­seram supor - sem fornecer a mínima prova - que o emprego da tortura era mencionado em registros especiais que hoje estão desa­parecidos... Nas 630 sentenças registradas nos arquivos de Tolosa, desde 1309 a 1323, há uma única menção de recurso à tortura... O laconismo dos documentos é, para nós, indício muito sério do ca­ráter todo excepcional do emprego da tortura na região do Lan­guedoc. Fizeram-se as mesmas constatações na Provença, na França e em outros países do Norte»
(«Inquisition», em «Dictionnaire Apolo­gétique de la Foi Catholique» II. Paris 1911, col. 873s).
Em uma palavra: os moralistas e juristas da Igreja, na Idade Média, reconheceram o uso da tortura, que a jurispru­dência civil admitia. - Isto talvez cause estranheza ao leitor; todavia deve-se dizer que dentro das circunstancias da época medieval tal atitude não causava problema de consciência nem mesmo aos santos; a tortura devia parecer algo de justificado para quem vivia dentro dos quadros de pensamento e costumes dos séculos XII-XV.
4. A partir do século XVI. Com a Renascença e o huma­nismo do século XVI, a história entra em nova fase: a cultura geral se enriquece, as ciências progridem, terras remotas no Oriente e no Ocidente são descobertas... Estes dados mudaram o cenário da época e permitiram aos homens rever certos mo­dos de pensar e viver. Assim é que doravante a literatura reli­giosa apresentou sucessivos protestos contra a tortura. Todavia ainda se fizeram ouvir vozes de moralistas (entre os quais De Lugo, † 1660, e o próprio S. Afonso Maria de Ligó­rio,
† 1787) que julgaram poder justificar a tortura em casos bem restritos. Eis como raciocinaram:
O juiz tem o direito e o dever de procurar conhecer a rea­lidade dos fatos. Dado, porém, que o juiz esgote os meios normais para chegar à posse da verdade, o bem comum da sociedade pode exigir que submeta as pessoas suspeitas de crime a meios constrangedores, como a tortura. Os tutores da ordem pública têm a incumbência de apurar a responsabili­dade dos indivíduos indigitados.
Verdade é que cada pessoa tem o direito de falar e se calar segundo seu livre arbítrio. Todavia este direito deve ceder aos interesses da sociedade, desde que esta se veja ameaçada pelo silêncio ou pelo comportamento misterioso de um dos seus membros. Os danos que resultariam para a sociedade do fato de se ignorar o autor de determinado delito, podem ser bem maiores do que os males acarretados pela violação da liberdade ou dos direitos de um indivíduo.
Contudo mesmo os moralistas que assim pensavam, esta­beleceram condições bem definidas para que seja lícito o uso da tortura. Tais seriam:
a) contra o acusado já haja indícios que constituam uma prova semiplena (confissão extrajudicial, depoimento de uma testemunha insuspeita... );
b) a pessoa acusada não seja das que gozam da imuni­dade de tortura reconhecida pelo direito natural ou pelo direito positivo;
c) estejam esgotados todos os recursos mais brandos para apurar a verdade;
d) a tortura não seja insuportável a quem a sofrerá, levadas em conta as condições de saúde e resistência física dessa pessoa;
e) dê-se ao pretenso réu a oportunidade de confirmar ou de retratar em ambiente tranqüilo a confissão extorquida.
Veja-se a propósito S. Afonso Maria de Ligório, «Theologia Mo­ralis» IV, cap. 3 a.3, n° 202, II; J. De Lugo, «De iustitia et lure», disp. XXXVII, sect. XIII, ed. Fournials, VII. Paris 1869, p. 724.
5. Em nossos dias, ainda há juristas e oficiais de polícia adeptos da tortura. Esta verificação pode ser ilustrada pelo que se lê na revista «VEJA» de 10/12/69, pp. 20-22, donde
extraímos os seguintes trechos:
«Existem, e não são poucos, os que defendem as torturas.
Waldo Bandeira Fraga, quarenta anos, delegado de policia em Niterói, ... as admite abertamente: 'Eles são muito duros. O crimi­noso é gente muito receosa de passar por dedo-duro, ter de enfrentar os amigos depois, entende? Por isso é preciso muito pau em cima deles. Acho que a polícia está certa em agir assim'.
O delegado Eldes Schenini Mesquita, 35 anos, chefe de gabi­nete do Superintendente de Serviços Policiais de Porto Alegre, que é estudante de Direito... é um destes: 'O uso de tais métodos (de tortura) deverá um dia ser abolido, quando se puder fazer, de fato, a coação psicológica através de sistemas eminentemente científicos. O que se condena, é a dosagem em excesso dessa violência' (os grifos são do próprio delegado Schenini, que, pela gravidade de suas opi­niões, preferiu dá-las por escrito) ... No fim da semana passada, num manifesto distribuído por Volkswagens nas ruas centrais do Rio, um grupo de cidadãos que se assinavam com as siglas VAR­-Palmeiras, MR-8 e PCBR criticava veladamente todos os jornais do país e o próprio ministro da Justiça pela campanha iniciada pelo governo contra as torturas.
... Roger Willaume, inspector-geral das polícias civis da França no período da guerra da Argélia, expunha detalhadamente sua posi­ção pró-torturas. Dizia num relatório: 'Os métodos de água e eletri­cidade, desde que cuidadosamente usados, produzem um choque que é mais psicológico do que físico, e não constituem, portanto, cruel­dade excessiva... Esta conclusão, que nos leva de volta a um pas­sado recente e doloroso, pode parecer repugnante. Mas, desde que o problema está em nossas mãos, nós devemos enfrentá-lo com co­ragem'.
Os argumentos dos torturadores soam racionais, lógicos. 'Em nossa opinião, há duas coisas básicas quando se considera a questão das torturas. A primeira é que nós estamos em guerra - uma guerra contra a subversão - e que essas pessoas (isto é, os torturados) são os inimigos... A outra coisa é que uma pessoa com uma ideologia não dá informação 'de presente', teria dito a Peter Kramer, cor­respondente no Rio da revista semanal de informações americana 'Newsweek', alto oficial dos serviços de inteligência brasileiros... Talvez com boa intenção democrática e também com um excessivo zelo pelas idéias com que definem democracia, eles parecem dizer: 'É melhor dar pancadas neste cidadão e obrigá-lo a confessar onde estão os outros terroristas, para evitar que eles matem pessoas ino­centes'».
Os autores cristãos, porém, não hesitam em condenar categoricamente a tortura como até a Alta Idade Média fizeram. Os argumentos em que se baseia a rejeição merecem detida atenção.
3. Tortura? - Não!
1. A aplicação da tortura vem a ser um atentado contra a pessoa humana, tanto da vitima como do carrasco; por isto um procedimento intrinsecamente ou por si mau.
Com efeito, toda pessoa humana tem direito a
a) ser respeitada ou ser tida como inviolável na alma e no corpo. Em conseqüência, tem o direito de não ser maltra­tada fisicamente (desde que não haja evidência de que merece uma pena), como tem o direito de guardar os segredos que esteja obrigada a conservar.

b) Outrossim tem o direito de manter, ou de não con­correr para vilipendiar, a sua reputação.
A Declaração dos Direitos do Homem, promulgada pela ONU em 1948, reza no seu artigo VII:
«Ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante».
Tais dizeres fazem eco ao artigo 9° da «Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão» votada pela Assembléia Constituinte Fran­cesa aos 26 de agosto de 1789:
«Todo homem se presume inocente antes de ser declarado culpa­do; mas, se a sua prisão for considerada indispensável, todo rigor excessivo na detenção da sua pessoa deverá ser severamente repri­mido pela lei».
O Código de Direito Canônico, inspirando-se neste direito, assim reza
«As pessoas indigitadas têm a obrigação de responder e confessar a verdade ao juiz que as interrogue legitimamente, a menos que se trate de falta cometida pelo próprio sujeito interrogado» (cân. 1743, § 1).
De resto, a jurisprudência eclesiástica, segundo o atual Código de Direito Canônico, não admite o uso de qualquer tipo que seja de coação, para se obter a confissão de uma pessoa suspeita.
2. Se a tortura é intrinsecamente má, ela não pode ser utilizada nem mesmo para se obterem informações que permi­tiriam salvar a vida de pessoas inocentes. O fim não justifica os meios. O que é intrinsecamente mau, fica sendo mau, quais­quer que sejam as circunstâncias em que possa ser aplicado.
3. Verifica-se, de resto, mais e mais algo de que os medi­evais já tinham consciência: a tortura pode, em não poucos ca­sos, obter toda e qualquer confissão (mesmo falha ou mentirosa) de delito sugerida pelos juizes e carrascos. Um inocente então vem a ser apresentado ao público como criminoso e punido como tal; comete-se assim a injustiça sob foros de legalidade e abre-se às autoridades porta para todo tipo de arbitrariedade. Nem se tomam em nossos dias as cautelas que (como dito atrás) os medievais estipulavam em favor do réu.
4. Nos tempos atuais tem-se usado em processos policiais a narco-análise. Esta consiste em que se ministrem ao paciente narcóticos exatamente dosados (as drogas ou o soro «da ver­dade») que colocam o indivíduo num estado intermediário entre a consciência lúcida e o sono; assim a pessoa perde o devido controle de suas palavras e de seus gestos; sofre di­minuição em sua capacidade de autocrítica e torna-se parti­cularmente sugestionável frente ao médico ou operador que pretende dirigi-la. Tal método, aplicado em processos judiciá­rios, constitui um atentado à personalidade humana talvez ainda mais grave do que a tortura. A consciência cristã o re­jeita sem hesitação.
De resto já se disse que o uso de torturas é como uma indústria de desajustados, de tal modo traumatiza psiquica­mente os pacientes:
«O processo de tortura é como uma indústria de desajustados. Cria um clima de terror que age sobre todas as pessoas, inclusive sobre aquelas que não têm envolvimento político. Acentua sintomas e idéias de perseguição. Gera apreensão, expectativa, quase que um pânico generalizado. Cria-se um clima de ansiedade que a gente per­cebe no ar. E esse clima acaba transportando-se para outras áreas não especificamente ligadas ao aspecto político, interferindo na produ­tividade e no relacionamento familiar» (palavras do médico psiquiatra Antônio Sapienza, publicadas por «VEJA» aos 10/12/69, p. 23).
5. Tenham-se em vista os dizeres do S. Padre Pio XII proferidos em um discurso aos participantes do VI Congresso de Direito Penal Internacional (3/10/1953):
«Já o primeiro passo da ação punitiva, a prisão, não pode obede­cer ao capricho, mas deve respeitar as normas jurídicas. Não se pode admitir que até o homem mais irrepreensível possa ser preso arbitrariamente e sumir-se sem mais numa prisão. Mandar alguém para um campo de concentração e conservá-lo nele sem qualquer processo re­gular, é zombar do direito.
A constituição do processo deve excluir a tortura física e psíquica e a narco-análise, primeiro por lesarem um direito natural, mesmo se o acusado é realmente culpado, e, depois, por muitíssimas vezes da­rem resultados errôneos. Não raro, de fato, levam exatamente às confissões desejadas pelo tribunal e à condenação do acusado, não por este ser culpado em verdade, mas porque a sua energia física e psíquica está esgotada e ele se encontra pronto a fazer toda espécie de declarações que desejem. ‘Antes a prisão e a morte que tal tortura física e psíquica!’ Deste estado de coisas encontramos abundantes provas nos processos espetaculares bem conhecidos, com as suas con­fissões, as suas auto-acusações e os seus pedidos de castigo inexorável.
Há 1.100 anos aproximadamente, em 866, o grande Papa Nicolau I respondia da maneira seguinte a um dos pedidos dum povo que acabava de entrar em contato com o Cristianismo:
'Se um ladrão ou salteador é apanhado e nega o que lhe imputam, afirma-se entre vós que o juiz lhe deve bater na cabeça e atravessar­-lhe os lados com pontas de ferro até ele dizer a verdade. Mas isto nem a lei divina nem a humana o admite: a confissão não deve ser forçada, mas espontânea; não deve ser extorquida, mas voluntária; afinal, se acontece que, depois de se terem infligido estas penas, nada absolutamente se descobre do que se, lhe imputava, não vos enver­gonhais, nesta altura ao menos, e não reconheceis quanto foi ímpio o vosso julgamento? Do mesmo modo, se o acusado, não podendo suportar tais torturas, confessa crime que não cometeu, dizei-me: Quem fica responsável de tal impiedade senão quem o constrangeu a semelhante confissão mentirosa? Mais ainda, todos sabem que, se alguém profere com os lábios o que não tem no espírito, não confessa; fala apenas. Renunciai, portanto, a estas coisas e amaldiçoai do fundo do coração o que, até o presente, tivestes a loucura de praticar; com efeito, que fruto tirastes então daquilo de que agora vos envergo­nhais?...'
Qual de nós não desejaria que, durante o longo intervalo decor­rido desde então, a justiça não se tivesse jamais afastado desta regra! Ser necessário hoje recordar advertência feita há 1.000 anos, é triste sinal das aberrações do procedimento judicial no século XX.
Entre as garantias da ação judicial, conta-se também a possibi­lidade, para o acusado, de se defender realmente, e não só na apa­rência. Deve-se-lhe permitir, a ele e ao seu defensor, apresentar ao tribunal tudo quanto depõe em seu favor; é inadmissível que a defesa não possa dizer senão o que agrada ao tribunal e a uma justiça parcial» (transcrito da «Revista Eclesiástica Brasileira» XIII [19531, pp. 979s).
As palavras de Pipo XII, sintetizando o pensamento da Igreja sobre torturas, têm em nossos dias plena atualidade.
Pequena bibliografia:
Pio XII, Discurso ao VI Congresso de Direito Penal Internacio­nal (3/10/1953), em «Revista Eclesiástica Brasileira» XIII (1953) pp. 979s.
Fiorelli-Palazzini, «Tortura», em «Enciclopedia Cattolica». Città del Vaticano XII, cols. 337-343.
B. Haering, «La Loi du Christ», vol. 3. Paris 1959, p. 685.
A. Mellor, «La torture». Paris 1949.
Fr. Helbing, «Die Tortur». Berlin 1926.
«Torturas», em «Veja» n9 66, 10/12/1969, pp. 20-27.
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